Recentemente fui assistir à peça A Alma Imoral, baseada no livro homônimo de Nilton Bonder. Uma passagem me marcou: a saída dos hebreus do Egito. É muito interessante a explicação dada pelo autor, como o próprio diz “é um símbolo de movimento ativo para deixar a escravidão rumo à liberdade, esse acontecimento em muito se presta para exemplificar os processos humanos que realizam movimento semelhante.”
O Egito é um símbolo do lugar que já foi bom, e não o é mais. A etimologia hebraica para a palavra Egito é mitsraim, significa “lugar estreito”. Fica mais interessante ainda, não é? O lugar que foi bom, torna-se estreito, forçando a saída. Todos nós já estivemos em lugares que se tornam estreitos, que um dia foram bons para nosso desenvolvimento e amadurecimento, mas em que algum momento já não servem mais e se tornam limitadores. O próprio começo da vida é assim. No ventre materno enquanto é apenas um embrião o espaço é quase oceânico, com o passar do tempo e do desenvolvimento o lugar se torna estreito, sendo necessário uma saída.
E o processo de saída se depara com uma barreira tão real e profunda como o próprio mar. Como transpor esse limite? E para dificultar mais ainda, não gostamos de sair e mudar. Mas o desconforto de ficar nos força ao movimento, contudo…para onde ir se o que conhecemos é apenas o lugar estreito que já fora bom outrora? E saindo em caminhada encontramos essa barreira intransponível, o mar. E agora?
Passado um momento em que nos questionamos se sair foi a melhor escolha, chega o desespero de sentir a própria extinção próxima. O povo hebreu sentiu isso quando ficaram encurralados entre o mar e o exército egípcio. E de acordo com o ensinamento eles se dividiram em quatro acampamentos que simbolizam os comportamentos clássicos do ser humano nesse processo de saída:
O primeiro quer voltar. O segundo quer lutar. O terceiro quer se jogar ao mar. E o quarto reza. Essas posturas representam a resistência. O acampar é o mesmo que empacar no processo. Voltar significa reconhecer o poder do lugar estreito, do hábito, e que sair não passou de uma ilusão. O melhor é se encaixar.
Lutar é achar que se pode fazer do lugar estreito um lugar mais amplo. É achar que a estreiteza é um conceito externo e não uma relação entre mundo interno e externo. Devemos nos esquecer que o ventre materno um dia não foi estreito? Todo lugar estreito um dia não o foi.
Jogar-se ao mar é a atitude do desespero. Voltar ao lugar estreito não é possível, atingir a terra prometida é uma ilusão. Resta pagar o preço pela desobediência.
Orar é tentar fazer do novo uma reprodução do lugar estreito. É querer que a realidade seja compassiva e não exija nenhuma redefinição de si mesmo, eu mudo apenas de lugar e a mudança interna não acontece. O novo lugar é o velho sem parecer estreito.
E qual foi a resposta de Moisés aos quatro acampamentos? Aos que querem voltar, fiquem; aos que querem lutar, não lutem; aos que querem se jogar ao mar, não se joguem; aos que rezam, que parem de rezar. Nenhuma dessas alternativas representa o futuro e a saída. O que Moisés ouviu de Deus foi: “Diga a Israel que marche”
O interessante é um comentário que eu particularmente desconhecia. O mar se abre sim, mas não foi aos primeiros passos. Um homem que não sabia nadar adentrou ao mar e caminhou. Somente quando a água estava na altura de seu nariz, o mar se abriu. Diferente do acampamento que queria se jogar ao mar em desespero, este homem compreendeu: o futuro existe se você marchar. Sua alma o guiará até a outra margem, guiará o caminho seco através do molhado. Abrir mão de tudo na fé que o amanhã se constituirá, é caminhar até onde não dá mais pé, e enquanto estiver dando pé estará estacionado no acampamento.
É um relato sobre profunda confiança em si e no processo da vida, na alma, que garante a passagem pelos obstáculos e concretiza o que não existia. Um novo lugar amplo. Pense agora em sua trajetória profissional e de vida. Por quantos lugares amplos você já passou? Quantos se tornaram estreitos? Quais caminhos você tomou para sair? Quais mares você atravessou? Ou você se encontra em algum dos acampamentos da vida, estacionado…voltando, lutando, se jogando em desespero ou rezando por complacência?
Um dia participei de um evento e fazíamos sessões de coaching de 15 minutos, speed coaching, para jovens talentos. Um deles me disse: “sinto que estou caminhando, avançando, mas estou chegando num ponto em que a beirada é visível…e uma hora tenho que dar o salto da fé, já estudei tudo, já previ tudo, já pesquisei tudo, não há mais o que fazer…acho que estou pronto! Vou dar o salto da fé!”
E você, está pronto para dar o seu salto da fé? Está pronto para caminhar até onde não dá mais pé? Vamos juntos então!
Forte abraço!
Alexandre Nakandakari
O que é bom dura uma eternidade. Eu assisti há mais de 7 anos e devo concordar que peça maravilhosa. Nlton Bonder, nem se fale!
abraços
Olá Carlos!
É verdade! O bom é da alma! Obrigado por passar aqui!
Abraços!