Que sensação boa de plenitude podemos vivenciar quando, do nada (pelo menos, aparentemente), vem esse pensamento à nossa mente: “O melhor lugar do mundo é aqui…e agora!”. Sábio e inspirado Gilberto Gil, quando compôs “Aqui e Agora”! E penso que é tão raro termos essa sensação, que vale uma pequena reflexão.
Manhã quente de Carnaval em São Paulo. No retorno da caminhada num bairro tranquilo e arborizado, observo o movimento nas ruas. Algumas pessoas acordando e outras indo dormir. Seja porque foram protagonistas de um desfile na avenida, seja porque foram plateia de um espetáculo que vivenciaram ao vivo. Ou, ainda, telespectadores atentos, confortavelmente acomodados em frente aos seus televisores. Não importa. O fato é que fizeram suas escolhas. Ou não, já que estudos recentes da neurociência vêm apontando que não fazemos escolhas na vida – pelo menos não de forma consciente. Interessados no tema sugiro acessar: http://super.abril.com.br/saude/o-livre-arbitrio-nao-existe/.
Mas isso também não vem ao caso nesse momento. Se escolhi ou não estar ali naquela manhã, o ponto crucial é que me “dei conta” de estar vivenciando aquele momento e, mais importante ainda, eu o considerei como o melhor lugar para estar (o que, admito, é uma sensação um tanto quanto rara).
Mas, e aí? Por que é tão difícil vivenciarmos o “aqui e agora”? Por que estamos sempre viajando com nossos pensamentos, deixando de saborear o momento presente, nos preocupando com o que devemos fazer no minuto seguinte, sendo que não temos o menor controle sobre esse futuro? Ansiedade, falta de foco, deficit de atenção, hiperatividade, estresse? Nada disso ou tudo isso junto e misturado?
Difícil saber e sempre vale investigar, claro! Achar que é natural esse devaneio porque vivemos numa grande metrópole assolada por uma frenética corrida inquietante, sendo bombardeados por notícias ruins num cenário político e econômico permanentemente conturbado, com certeza não é o melhor caminho para nossa sanidade mental.
Segundo Perls, pai da Gestalt Terapia, aqui e agora é o momento presente. O presente é a única possibilidade, a única realidade possível. O comportamento é uma função do campo e não depende nem do passado, nem do futuro, mas do presente. O futuro são expectativas, objetivos e metas que dirigem as escolhas de hoje e que poderão ou não se concretizar. O futuro inspira o presente e o como é mais importante que o porque. Não há negação do passado, tampouco desvalorização da importância em traçarmos planos e metas para o futuro, mas trabalhar a conscientização do presente momento. Estar presente e inteiro no momento em que fazemos as nossas refeições pode ser um bom exemplo, já que muitas vezes sequer nos damos conta de que estamos com sede ou fome. E, evidentemente, essa negligência pode nos trazer sérios prejuízos.
Precisamos separar o real do imaginário. Todos os dias enfrentamos situações e nos preparamos para dar conta de resolver e lidar com nosso existencial concreto. Mas, o desgaste acontece quando só realizar o necessário, à medida que as coisas vão acontecendo, não basta. Reagimos como se algo fosse dar errado ou como se não pudéssemos relaxar porque se abrirmos a guarda, alguma coisa ruim pode acontecer. Vivemos num conflito interno que nos paralisa, extingue nossa motivação e a energia necessária para viver bem. Viver assim, além de extremamente desgastante, traz sérias consequências à nossa saúde e à nossa felicidade, como já foi dito.
E, se felicidade é um estado de espírito, como vivenciar mais vezes esta tão desejada sensação? Há uma vasta literatura tratando sobre o tema, mas observo que qualquer que seja a técnica ou a ferramenta sugerida, nada será atingido se não houver boa dose de dedicação – como tudo na vida, a propósito – e, principalmente, muito treinamento mental.
Entre as técnicas sugeridas destaco duas que me trazem bons resultados: o exercício diário da gratidão e a prática da meditação.
Gratidão
Pesquisadores da Universidade de Indiana, nos Estados Unidos, chegaram à conclusão de que ser grato pelas pequenas coisas da vida pode causar grandes mudanças cerebrais. Um artigo publicado no jornal científico NeuroImage atesta que, depois de poucos meses exercitando a gratidão por meio da escrita, nosso cérebro passa a se sentir ainda mais condicionado a ser grato. A pesquisa compara esse treinamento a exercitar um músculo: quanto mais você praticar a gratidão, mais propenso estará a senti-la espontaneamente no futuro.
O resultado é interessante para os neurocientistas que observam maior modulação neural no córtex pré frontal, mas também é potencialmente útil para todos nós. Isso sugere que quanto mais treinamos o cérebro em sentir e expressar gratidão, mais ele se adaptará a esse novo padrão mental. Como consequência, praticar a gratidão pode gerar um ciclo muito saudável, trazendo maior sensação de bem estar.
Meditação
Também há amplo conteúdo disponível sobre as diferentes técnicas de meditação e cada um de nós deve buscar aquela com a qual melhor se identifica. Graças a experimentos com equipamentos que monitoram o cérebro, a meditação já não é mais vista pela maioria dos ocidentais como algo puramente espiritual ou esotérico. A ciência também já demonstrou que a prática altera efetivamente o funcionamento do organismo. A meditação funciona como uma espécie de musculação mental, turbinando capacidades como foco, criatividade, concentração e rapidez para tomar decisões, habilidades muito valorizadas no mundo corporativo. Como a meditação ensina e desenvolve a capacidade de se concentrar, isso favorece a criatividade e a tomada de decisões, já que você presta mais atenção ao que está fazendo, abandonando o conhecido “piloto automático”, que é trabalhar de maneira mecânica, sem se concentrar na tarefa.
Uma prática bastante adotada em empresas atualmente é o “mindfulness”. Ela permite ao indivíduo experimentar um estado de concentração em si mesmo e nas experiências, atividades e sensações do presente, sem pensar no passado ou no futuro. É a chamada atenção plena ou consciência plena. Ela pode ser aplicada também em hábitos da vida diária como quando cozinhamos, tomamos banho, escrevemos um artigo, caminhamos…
… Epa! eu falei “caminhamos”? Pintou um insight agora que me remeteu ao início desse texto! Não é que essas ferramentas podem funcionar mesmo se a colocarmos em prática? Quem sabe se nós as utilizarmos mais vezes, escolhendo aquela com a qual mais nos identificamos e que nos traga prazer, não colheremos os tão almejados benefícios à nossa saúde mental e física?
Talvez valha tentar. Afinal, como citou o grande poeta espanhol, Antonio Machado: “o caminho faz-se caminhando”.
Aproveite a musica de Gilberto Gil!
Malu Sanches
Psicóloga, com especialização em Neuropsicologia, pelo Centro de Estudos de Neurologia do Depto de Neurologia da Faculdade de Medicina da USP;
Coach, com formação pela NeuroLeadership Group, metodologia de NeuroCoaching/RCS – Results Coaching Systems;
Consultora de RH desde 2013. Anteriormente, atuou na vida corporativa por mais de 25 anos, exercendo funções de liderança em todos os subsistemas de RH .
Adorei, Malu.
Sou muito grata por sua amizade.
Você é uma amiga incrível e uma baita profissional.
Bjs,
Luci
Olá, Luci. Que bom que gostou.
E a recíproca é verdadeira, querida. Gratidão.
um beijo
Malu, excelente ! Gostei muito e vou tentar praticar.
Abçs
Fico contente que gostou, Ferrari. E, melhor ainda, que vai praticar.. Me conte os resultados depois. Obrigada pelo retorno. bjs