Segundo o sociólogo polonês Zygmunt Bauman, falecido em jan/2017, vivemos tempos líquidos. Essa é, na visão do autor, o momento histórico que vivemos. Os tempos são líquidos, pois tudo muda muito rapidamente, não dando tempo para que as coisas se solidifiquem. É um tempo de incertezas, onde nada mantém sua forma por muito tempo. Essa mutação permanente afeta todos os aspectos de nossa vida: relacionamentos, laços familiares, educação e carreira. O mundo de hoje não é o mundo de amanhã, literalmente falando. Já existem estudiosos falando da transição dos tempos líquidos para os tempos gasosos, onde as coisas se esvanecem, parecem evaporar e desaparecer.
Vamos ver um exemplo quando falamos da questão dos relacionamentos:
Como toda a fase de transição, temos na sociedade todos os modelos convivendo juntos e misturados, o que torna tudo mais complexo, mas também mais interessante.
No mundo do trabalho e das carreiras tudo isso também tem impacto. Como vamos trabalhar no futuro, quem será o trabalhador dos tempos gasosos?
Um estudo da consultoria McKinsey, publicado na revista Exame de 15/02/2017, pesquisou os avanços da robótica e da inteligência artificial e chegou à conclusão que nos próximos 50 anos a melhoria da produtividade será o motor do mundo. Isso afeta o mundo do trabalho, pois formas de gerar mais produtividade serão fortemente desenvolvidas. O estudo mostrou que nos Estados Unidos metade do tempo que os profissionais dedicam ao trabalho é gasto com atividades que tem potencial de automação. As mudanças que ocorrerão em função da automação deverão afetar centenas de milhões de trabalhadores em todo o mundo até 2065. Temos o desafio de preparar os trabalhadores para um mundo cada vez mais tecnológico.
Por outro lado, o transumanismo, técnica que procura melhorar o desempenho humano, vem desenvolvendo ferramentas tecnológicas implantadas no corpo para que nos tornemos super-humanos e assim possamos competir com as máquinas. Segundo Bem Goertzel, professor e pesquisador do laboratório para sistemas de inteligência artificial da Universidade de Xiamen, na China, no futuro teremos ciborgues (híbridos de homem e maquina) andando pelas ruas.
Mais um componente para essa visão de futuro inclui a internet das coisas – a ideia é que o mundo físico e o digital se tornem um só, através de dispositivos que se comuniquem entre si e entre os data centers e suas nuvens. Aparelhos vestíveis, como o Google Glass e o Smartwatch 2, da Sony, transformam a mobilidade e a conectividade com a Internet em diversos objetos em uma realidade cada vez mais próxima.
Como tudo isso vai transformar o mundo do trabalho é uma reflexão importante: como vamos sobreviver e nos adaptar a esse novo mundo que está se delineando?
Na verdade, os profissionais terão que criar o futuro e não mais se adaptar a ele. Em um mundo gasoso será desafiador buscar referências externas para guiar nossa conduta. Teremos, sim, que a partir de nós mesmos, criar novas formas de trabalhar e gerar valor para o mundo.
No mundo líquido as carreiras já estão cada vez mais flexíveis e tomam formatos diferentes para atender às necessidades das empresas e também dos trabalhadores. Não é mais viável o emprego vitalício e nem a “hereditariedade” de carreira de pai para filho como nos tempos sólidos.
Abaixo alguns formatos de carreira típicos dos tempos líquidos:
Carreira Sem Fronteiras: se caracteriza por uma relação independente e de acordos baseados no mútuo interesse, entre empresa e profissional, definindo-se prazos, projetos e remuneração que atendam às necessidades do profissional e às condições que a empresa tem a oferecer.
Carreira Proteana: nesse formato o que vale é o sucesso psicológico e o grau de satisfação do profissional, assim como o equilíbrio com as demais áreas da vida como: família, paz interior, relacionamentos, etc. O conceito de carreira, onde a busca pela ascensão na hierarquia e a remuneração davam a tônica, é totalmente contrastante à carreira proteana.
Carreira Caleidoscópio: na qual pessoas visam conciliar suas necessidades de autenticidade, equilíbrio e desafios. Um exemplo claro desse formato é a forma como algumas mulheres mudam o rumo de acordo com as diferentes fases da vida. O espírito aqui é rearranjar a carreira de acordo com as necessidades do momento.
O que vem agora, o que está nascendo em termos de formatos de carreira?
Na minha área, que é a de desenvolvimento de pessoas, o que tenho visto é crescer o número de pessoas vivendo de acordo com os seus propósitos e desenvolvendo trabalhos que contribuam para o desenvolvimento das pessoas e que também lhe propiciem crescer junto. São pessoas que abriram mão do trabalho CLT dentro das áreas de RH das empresas e passaram a se orientar por um chamado interno e dessa forma passam a contribuir com o mundo do trabalho. Ainda na minha área vejo profissionais fazendo parcerias para unir forças e implementar novos trabalhos, que sozinhos teriam mais dificuldade. As relações entre profissionais Consultores de RH nos tempos sólidos era muito competitiva e cada um tinha seu espaço delimitado e não se juntava a ninguém, pois a visão era de divisão e não de soma.
Muito provavelmente as novas tecnologias vão ampliar ainda mais a possibilidade de se trabalhar em qualquer lugar do mundo e em qualquer horário. Hierarquias flexíveis irão surgir para acompanhar o poder descentralizado e mutável. Será a era do trabalho temporário, colaborativo e consequentemente mais inseguro. Também será o tempo de mais cuidado com a natureza, maior criatividade, consumo mais consciente e ampliação da congruência.
Uma tendência chamada “carreira portfólio”, na qual o profissional é empreendedor de si mesmo e gerencia diferentes atividades e projetos é algo que deve se intensificar e, portanto, devemos nos desenvolver para administrar múltiplas frentes de trabalho.
Um estudo apresentado no Fórum Econômico Mundial, em Davos na Suíça, mostra que 65% das crianças que entram na escola atualmente irão trabalhar em algum tipo de atividade que ainda não existe. Esse cenário torna importante o desenvolvimento de profissionais capacitados para as demandas do futuro, além de empresas que entendam a profundidade das transformações que o presente já está mostrando e que se intensificarão daqui para a frente.
Veja o vídeo abaixo que traz uma entrevista sociólogo polonês Zygmunt Bauman para o programa Milênio da Globo News:
Caro leitor traga suas reflexões sobre esse tema no campo para comentários, será interessante saber o que pensa a respeito.
Abraços,