No embalo de todas as mudanças que aconteceram, e ainda acontecem, nas organizações, as áreas de RH também se redesenharam quebrando paradigmas de atuação e de posicionamento estratégico.
O aparecimento dos BPs (business partners) de RH ou, como preferem alguns, consultores internos de RH, parece ser a tradução mais clara do recente desejo do RH de posicionar-se mais próximo ao seu cliente interno podendo, desta forma, prestar um serviço mais adequado ao “negócio”. Chama-se este posicionamento de RH estratégico quando combinado com outras manobras de estrutura e de processos.
Dotado de um perfil generalista o BP deveria atender seu cliente (preferencialmente gestores) na maior parte das necessidades de RH por ele, cliente, manifestadas e deveria apoiar-se matricialmente nas áreas especialistas (R&S, T&D, cargos e salários, carreira…) quando sua análise indique esta necessidade. Comparado ao passado, sem nostalgias, esta mudança aponta para uma atuação mais focada na necessidade do cliente interno e, obviamente, gerou também como consequência (ou como princípio?) uma redução de custo de estrutura de RH nos diversos sites de uma mesma empresa.
A convivência com pelo menos duas gerações destes profissionais (os BPs), a observação in loco do trabalho que fazem, e ainda, as parcerias firmadas para promover intervenções nas organizações, permitiu uma visão privilegiada de como pensam, o que sentem e como agem estes profissionais atualmente.
O olhar “viesado” de ontem, de quem trabalhou em um RH tradicional há 30 anos, ajuda a entender parte do trabalho complexo de hoje destes profissionais, propondo reflexões e fazendo questionamentos. De novo, sem nostalgias, apenas com a intenção de compreender e ajudar no exercício do papel do BP.
A grande virada, como já foi dito, foi sem dúvida o aparecimento do “conector inteligente” que faz a ligação entre a demanda (do negócio, do cliente interno) com as políticas, soluções e práticas de RH.
Fica desta forma endereçado o trabalho de desenvolvimento (latu senso) do RH, passando as áreas transacionais (pessoal, benefícios, logística de T&D, primeiras etapas de R&S…) para uma estrutura centralizada que pode ou não abrigar outras áreas transacionais da empresa (finanças, contratos, compras…), conhecida como Centro de Serviços Compartilhados, ou variações desta denominação.
No papel e na lógica, como sempre, parece ser uma manobra inteligente de estrutura e posicionamento, muito aderente (como gostam alguns) às mudanças de cenários e discursos organizacionais. Nasce o RH estratégico.
Alguns mais ousados, ou entendendo-se visionários, já estão pensando em subordinar o RH às áreas de negócio, deixando no corporativo uma espécie de “agência reguladora de RH” esvaziada de expertise, e com poder (?) apenas de regulamentar políticas e práticas. Este parece um caminho perigoso que dissimula tecnocraticamente o grande e saudável conflito com o qual RH e gestores lidam cotidianamente: pessoas x empresa. Quem viver verá.
De qualquer forma, como estas mudanças impactaram na vocação da área de RH? Como transformou os perfis e a formação dos profissionais da área? O que significa atender necessidades dos clientes internos? Estas, entre outras, são as questões que interessam ser discutidas e que sugerem reflexões.
A primeira vista muda o perfil do profissional do campo (o BP), não só por conta da orientação generalista, mas principalmente por questões de posicionamento. Aproximar-se e entender melhor do negócio (crítica feita aos RHs do passado), possibilitou uma visão mais pragmática e menos romântica (outra crítica ao passado) dos problemas que envolvem pessoas em um contexto específico.
Assim, o negócio está sendo ouvido de perto, cresceu de importância na agenda do RH e tornou suas demandas urgentes, necessárias, importantes; indicadas através, principalmente, do entendimento de um gestor que, por princípio, sabe o que está pedindo porque entende de gestão de pessoas. É claro que o BP não opera só sob demanda, também faz sugestões e intervenções a partir da sua visão “técnica” da necessidade da área que atende, sempre em parceria com seu cliente e com áreas de expertise.
Só por esta rápida análise já se pode evidenciar as principais competências e conhecimentos destes profissionais. Postura e posicionamento no atendimento ao cliente (aspectos da relação de ajuda, escuta ativa, crítica de estereotipias dos clientes, influência sem hierarquia…) visão de desenvolvimento organizacional, conhecimento de ferramentas de diagnóstico e de intervenção organizacional, processos e ferramentas técnicas de RH. A lista poderia continuar, mas só esta pequena amostra indica a profundidade da mudança e a complexidade do exercício do papel do BP. Por outro lado, não se trata de exercer apenas o papel de um tomador de pedidos, mas um suporte de gestão de pessoas aos gestores do negócio. Implicitamente neste cenário, e por isso mesmo não citadas, estão as pessoas que, em respeito ao modelo, são “ouvidas” e atendidas através do seu gestor (representante do negócio) e do seu BP.
Assim, este modelo sugere um posicionamento junto aos players cotidianos, que precisa ser revisto constantemente e pode ser melhor entendido graficamente através de uma pirâmide de 3 lados que procura traduzir os relacionamentos e demandas vividas pelo BP.
Mais do que em qualquer outro tipo de estrutura, esta exige posicionamento baseado em premissas e valores pessoais e de RH muito claros e fortemente compartilhados entre todos os representantes de RH.
Na figura acima a idealizada posição de equilíbrio, equidistante das três demandas, sempre buscada, mas de difícil sustentação na prática.
Por outro lado, os diversos formatos possíveis fora do equilíbrio pretendido, sugerem tendenciosidades problemáticas como, por exemplo, na figura abaixo, uma postura de caráter mais tecnocrático, ou seja, deve ser cumprido aquilo que o RH preconiza e legisla, a orientação é não customizar.
Outra possibilidade aproxima o posicionamento do BP para uma escuta quase que exclusiva ao negócio. Ou seja, tudo deve ser customizado para o cliente em questão. Uma conseqüência imediata é o provável desalinhamento das políticas e práticas de RH entre as diversas áreas atendidas pelos BPs.
Ou ainda, o posicionamento do BP mais próximo das pessoas pode levar a um “humanismo não pragmático”, provavelmente em desacordo com premissas e intenções da maior parte das empresas.
Como o RH se preparou ou vem se preparando para dar sentido e significado a estes posicionamentos em relação aos valores e as diretrizes da empresa? Ou apenas rendeu-se aos imperativos do negócio, esquecendo sua vocação essencial? Como preparar o BP para enfrentar a complexidade da sua atuação? Que perfil é mais adequado para esta posição, de administradores? De psicólogos? De assistentes sociais?
Sem estas necessárias e importantes revisões e reflexões fica muito difícil para o RH contribuir dialeticamente para o negócio preservando a saudabilidade (mental, física e relacional) das pessoas nas organizações com a ajuda deste novo modelo.
Abraços,
Luis Felipe Cortoni
Formação em Psicologia. Filosofia (incompleto).
Trabalhou no Departamento de Desenvolvimento Gerencial da Mercedes Benz do Brasil em 1981.
A partir de 1984 foi gerente de RH na Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo.
Em 1986 iniciou seus trabalhos de consultoria.
Ex-professor universitário nas cadeiras de psicologia educacional, sociologia, e sociologia da educação.
Consultor para empresas da Europa (Portugal/ Espanha) e da América Latina desenvolvendo trabalhos na área de comportamento humano nas organizações.
Professor na pós graduação da Fundação Vanzolini – POLI/USP.
Autor de vários artigos publicados na imprensa.
É sócio-gerente da LCZ Desenvolvimento de Pessoas e Organizações e do Ateliê de Pesquisa organizacional.
Muito interessante buscar entender o papel do BP em relação a tríade RH, Negócios, Pessoas. E como foi usado um elemento geométrico, sugiro que esse triângulo esteja contido em um círculo, assim o BP torna-se o elemento circundante que une a tríade, possibilitando que a base estável (triângulo) se movimente (círculo).
Oi Giobert, que bom recebcermos o seu comentário! Sua ideia é bem interessante, uma vez que o BP realmente deve dar a liga entre a estratégia de negócios, as áreas de expertise de RH e as pessoas. O circulo daria o equilibrio necessário ao papel do BP. Também gostei muito desse artigo.
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