Em meu dia-a-dia trabalhando com gestores, vejo como muitos se frustram com a equipe. Já ouvi alguns dizerem que a equipe vinha trabalhando bem, mas sem motivo aparente teve queda no desempenho. Os mesmos gestores procuram trabalhar com algum clichê motivacional, tentando inspirar seus funcionários. Isso acaba se tornando um efeito placebo e que dura pouco. Eles entram no ciclo de frustração e motivação, que só terá fim quando entenderem que o que deve mudar é sua maneira de fazer gestão.
Imaginem Walter, um consultor de vendas de uma multinacional de serviços. Walter é competente e apaixonado pelo que faz. Assim como os demais consultores de vendas, Walter tem as seguintes atribuições:
1- Sua primeira atribuição é obviamente vender. Ele deve negociar novos serviços com os clientes de sua carteira e captar novos clientes. Walter faz isso como ninguém, seja por telefone ou ao vivo e ele eventualmente realiza a venda com muito sucesso.
2- Outra atribuição é inserir os resultados de suas vendas no sistema. O sistema é novo, mas muito útil para os relatórios executivos mediante a consolidação dos resultados e para realizar as projeções de vendas. Walter não é muito fã de sistemas, porém está disposto a aprender a utiliza-lo. Ele está até empolgado com o que ouviu falar, pois simplificará seu trabalho ao reportar seus resultados, que já são ótimos, além de direcionar melhor seus esforços de vendas.
3- Algumas vezes, Walter e os outros consultores de vendas devem realizar apresentações para a diretoria de uma empresa, principalmente clientes maiores que possuem mais de uma pessoa envolvida na tomada de decisão. Walter se dá muito bem vendendo ao telefone e em negociações um-a-um, mas ele possui verdadeiro pavor de apresentações em público. Walter já fez no passado e foi tão massacrado por perguntas e questionamentos, que ele até sabia a resposta, porém ficou nervoso, acabou se enrolando e não fechou a venda. Walter conhece bem seu negócio, trabalha há mais de 20 anos no mercado, mas fica acanhado diante de um público maior.
4- A última atribuição de Walter é fazer seu orçamento anual. Ele precisa orçar seus gastos para o ano. Walter sente que não tem uma cabeça para finanças e não quer analisar custos para todo o ano. Prefere se sentir livre e ter o mesmo custo arredondado do ano passado, mais a inflação. Porém a empresa demanda uma análise mais detalhada para controle de custos. Embora conheça bem seu produto, ele sente que é a pessoa da ação e não do planejamento. Por ser muito bom em sua comunicação, Walter tem empurrado com a barriga essa tarefa, ou sempre ocupado demais para fazer, mas seu prazo já estourou.
Walter se parece com algum esquizofrênico que hora faz bem seu trabalho, hora não faz? Na verdade, somos todos assim. Pense em você mesmo, você faz bem tudo o que deve fazer? Certamente você tem alguma tarefa, que é como o orçamento do Walter, que você tem empurrado com a barriga.
Muitos gestores quando se deparam com um excelente funcionário em sua equipe, esquecem que são assim somente para determinadas tarefas. Sentem-se traídos em sua confiança quando este mesmo funcionário falha em outras tarefas, quando a verdade nua e crua é que o gestor é quem precisa se adaptar a cada situação. Todo gestor possui uma tendência de liderança, ou estilo. Porém os líderes de sucesso são aqueles que se adaptam a cada situação.
Na situação 1, Walter é muito bom no que faz, certamente a delegação é bem vinda. Walter tem a liberdade de escolher seus cliente e seu foco como bem desejar. Um erro comum nessa situação é controlar ou monitorar excessivamente o trabalho de Walter, ele pode se sentir menosprezado, sem contar que você ainda estará dedicando tempo em algo que não precisaria. Walter não precisa de orientação, ele faz tão bem que pode andar com as próprias pernas nessa tarefa e faria melhor do que você inclusive. Qualquer interferência inapropriada pode prejudicar o desempenho e a empolgação de Walter em suas vendas.
Na situação 2, Walter não sabe usar o novo sistema, mas está animado a aprender, o que significa que seu aprendizado será rápido e eficaz. Um erro comum nessa situação é não fazer com que Walter possa dedicar algum tempo para o aprendizado. Treinamento é investimento. Você mesmo, ou outra pessoa que domine o sistema podem ensina-lo a usar.
A situação 3, por sua vez, já é mais complicada. Walter é muito bom em vender, mas se sente inseguro diante de um público maior. Um erro comum aqui é tirar essa atribuição dele, o que poderá diminuir suas vendas com clientes grandes, aumentar sua frustração e ainda prejudicar seu desempenho nas vendas um-a-um. Você mesmo poderia praticar as apresentações com ele, ou ainda pedir que outro vendedor esteja junto nas apresentações, alternando entre ele e Walter, até que Walter se sinta confiante para apresentar-se sozinho.
A situação 4 parece complicada para alguns gestores, ou simples para outros. Neste caso, você deve diretivamente dizer a Walter o que fazer. Ele conhece o mercado e trabalha nele há 20 anos, projeções não são um problema para ele, mas todo ano é a mesma dificuldade na hora de fazer o orçamento. Um erro comum é delegar essa tarefa a outro, ou pior ainda é fazer por ele. Aqui entra a interferência diretiva, onde você firma um prazo, diz o que e como deve ser feito, sempre com muita educação e polidez. Ser diretivo e assertivo não é sinônimo de grosseria ou arrogância.
Muitos gestores têm batalhado para adquirir resiliência, como sendo o fator crucial. Realmente a resiliência é importante, porém mais do que isso é a capacidade do gestor escolher trabalhar adequadamente em cada situação, o que fará dele mais que um bom gestor, fará dele um grande líder.
João Motta
Trabalha com educação desde 1997 e é profissional de Recursos Humanos há 10 anos, tendo como principal foco o desenvolvimento de líderes. Já trabalhou em escolas, consultorias e grandes empresas como PepsiCo, Coca-Cola FEMSA e atualmente é Líder de T&D para América Latina na Cargill.