Cidade do Cabo, África do Sul, 15/04/17, 6h30 da manhã, largada da Ultramaratona Two Oceans! As sensações daquele dia continuam vívidas em mim: expectativa e adrenalina, um misto de confiança e medo, incerteza e coragem. Corredora há 18 anos, inúmeras provas de 10, 15, 21, 25 km e seis maratonas – 42 km – completadas, eu estava com o coração a mil. O sonho que tinha virado meta estava prestes a acontecer: correr os 56 km daquela que dizem ser a maratona mais bonita do mundo.
Depois do hino nacional, as pessoas se emocionam com a canção que inspirou o povo sul-africano, até mesmo Nelson Mandela… como não me inspirar?
“Shosholoza… Ku Lezontaba… Stimela Simpum’e South Africa”
“Seguindo adiante… Por estas montanhas… Trem da África do Sul!”
Tiro de largada! Como eu, milhares de corredores de vários países partem para uma jornada de alto grau de dificuldade, mais da metade da prova de subidas e descidas íngremes, mas de uma beleza ímpar: paisagens deslumbrantes, montanhas de um lado, e dois oceanos de outro, cada qual com sua beleza, em um extremo da Cidade do Cabo.
Os quilômetros vão se sucedendo, o corpo entra no ritmo, a mente fica cada vez mais focada. Primeiro surge o Índico, aparentemente calmo, nos convidando a cruzar a cidade. Depois vem o Atlântico, espetacularmente azul e iluminado pelo sol.
Os mais rápidos disparam na frente, outros como eu seguem seu ritmo, e lá do alto das montanhas, ao olhar para trás, eu podia ver muitos ainda lutando para chegar até ali. Nos momentos mais duros e subidas mais inclinadas, só pensava em continuar, mas dizia a mim mesma que aquela vez seria a primeira e única.
Uma certeza que rapidamente se desfez ao final das minhas quase sete horas de prova. Era a conquista do desafio tão sonhado, resultado de meses de exaustiva preparação. Medalha no peito, sorriso escancarado no rosto, lágrimas da mais pura alegria e cansaço, eu pensava que, afinal, eu havia sido capaz!
Naquele momento, pude experimentar o “real significado de ganhar”, como bem descreve Timothy Gallwey, conhecido como o pai do Coaching, em seu livro “O Jogo Interior do Tênis”. Aquela não havia sido uma forma de medir meu valor pessoal, muito menos de ter uma vitória sobre os outros. Ao contrário, havia sido um grande exercício de cooperação e de superação.
Cooperação entre tanta gente desconhecida, que trocava palavras de apoio, os mais experientes dando dicas durante a prova, incentivando dar mais um passo, todos nós parceiros no mesmo objetivo, chegar até o final.
Superação de quem buscava apenas fazer o seu máximo, vencer os obstáculos, realizar da melhor forma aquilo para o que havia se preparado, de acordo com seu potencial e momento de vida. De alguma forma, havia competição, mas em essência, era de cada um com seus próprios limites, descobrindo algo novo, curtindo cada momento daquele percurso, indo aonde ainda não havia chegado.
Agora, fazia ainda mais sentido a afirmação de Gallwey : “Ganhar é superar obstáculos para atingir um objetivo, mas o valor de ganhar só é comparável em grandeza ao valor do objetivo alcançado. Atingir o objetivo em si pode não ser tão valioso quanto fazer um supremo esforço para superar os obstáculos. O processo pode ser mais compensador que a vitória em si. A verdadeira competição é idêntica à verdadeira cooperação.”
Pude experimentar também o prazer enorme de superar um limite, pequeno diante de tantos corredores mais velozes, mais velhos ou que já estavam em sua 5ª, 10ª ou 20ª edição da prova. Mas aquele era o meu limite! Eu ainda não havia ido tão longe! E agora eu sabia: teria que rever meus planos e incluir a 2ª Two Oceans em algum dos próximos anos…
Essa experiência inesquecível só fez confirmar o significado de promover o desenvolvimento humano, essência do nosso trabalho com pessoas e empresas. Independente da formação, atuação profissional, histórico, idade, ou quaisquer outros fatores limitantes, sempre há algo mais para ser buscado! Mesmo quando isso significa fazer menos, mas continuar fazendo, dentro das condições atuais, sendo o melhor possível para o momento.
O importante é estar em ação, em profunda conexão com valores e metas pessoais, essas sim indispensáveis. Comparações e avaliações externas importam pouco diante desse “empoderamento” interior. Desempenhos superiores são importantes exemplos para admirar e servir de inspiração, sem jamais tirar o brilho das conquistas, mesmo que menores, buscadas com afinco e determinação, em qualquer dimensão da vida.
Por mais simples ou óbvio que isso possa parecer, nossa experiência com as empresas tem mostrado que é necessário investimento e trabalho especializado para resgatar a autoconfiança, a capacidade de ação consciente e disciplinada de pessoas, lideranças e equipes para produzir mais e melhor. Tem mostrado, principalmente, que quando esse resgate acontece, um salto é dado, uma nova visão se abre, não sendo mais possível voltar atrás, apenas seguir adiante, aprendendo, realizando com prazer e significado, conquistando, buscando novos desafios e novos limites. Afinal, quem é capaz de dizer onde eles estão?
Rosangela Bacima
Consultora, palestrante e estrategista no desenvolvimento do Capital Humano e Capital Social das empresas. Coach Executivo e Empresarial, formada pela ABRACEM. Especialista em Coaching The Inner Game, formada por Timothy Gallwey.
Larga vivência corporativa, com 25 anos em posições executivas nas áreas de RH e Responsabilidade Socioambiental.
Psicóloga, Pós-Graduada em Administração de Empresas, Mestre em Administração de Recursos Humanos. Docente em cursos de Pós-Graduação e MBA.